28 de dezembro de 2005

Dois Filhos de Francisco

Este filme se tornou um fenômeno tão popular que até dá um certo (e confesso esnobe) constrangimento assisti-lo ou até mesmo assumir tê-lo visto. É quase como assumir assistir aos domingos o programa do Gugu, ou dar algum crédito ao famigerado Domingão do Faustão... Mas uai, gosto de filmes de qualquer natureza, e claro que a cinebiografia da irritante dupla sertaneja Zezé de Camargo e Luciano não passaria batida por mim. E se as milhares de pessoas estiverem certas? E se aqueles elogios na imprensa (inclusive a revista Set) não forem um deslavado jabaculê? Caraca, o primeiro sinal de que não estava errado foi que as mais de duas (!!!) horas de película me pareciam oito! Uma pieguice rala, a que nem interpretações afinadas como as do eterno Beija-Flor Ângelo Antônio ou da talentosíssima Dira Paes conseguem dar um verniz menos enfadonho. E começa bem, com uma vidinha rural, moda de viola tocando no radinho de pilha, mas daí pra descambar ao lugar-comum é um pulo. Claro que com patrocínios como os que tiveram não dá pra alguém falar mal daquele maniqueísmo típico de qualquer telenovela. Quem sabe está aí a chave para o inusitado sucesso. A "inteligência" média ama assistir a algo de que já sabe o final. Talvez como a psicologia infantil, que permite rever o mesmo desenho animado inúmeras vezes, assim o infante se sente seguro. Segure o riso, se for capaz, para a aparição de um ônibus com logo da prefeitura de Marta Suplicy em plena década de 80! Falando nisso, triste é imaginar que após o sucesso, pessoas de passado tão humilde se submetem a subir a palanques políticos em troca de polpudos cachês como revelaram os recentes escândalos. Escreve o que eu digo, ou melhor, dá um control C e depois um control V nisto: Não me faça gargalhar imaginando uma indicação ao Oscar, e se porventura o lobby da Columbia for absurdamente forte, não há a mínima chance de a estatueta dourada vir ao Brasil em 2006! Se os yankees já são fechadíssimos a qualquer outra parte do mundo, imagina se vão digerir um roteiro picado e óbvio sobre dois latinos desconhecidos que possuem como único mérito terem vendido milhares de cópias de música muito ruim. E não caia você no conto de que, gostando ou não da dupla, o filme se segura por si. Volta e meia o telespectador é incomodado pelos gritos esganiçados deles, o que distrai a atenção exatamente nos pontos em que a trama ameaça se perder por completo. Fora o lamentável fato de uma criança morrer em um acidente, nada de realmente extraordinário. E nesse ponto, a gota d'água do desinteressante é a partir do casamento com a Zilu, interpretada por uma caricata Paloma Duarte de grampinhos na cabeça, bem diferente daquela emergente que hoje exibe na páginas da revista Caras todo o seu mau gosto ao pintar notas musicais em dourado na parede da sala. Há histórias de vida tão mais relevantes...

Dois Filhos de Francisco
- Brasil 2005 De Breno Silveira com Ângelo Antônio, Dira Paes, Paloma Duarte, Dablio Moreira 119' Drama


DVD - Edição bem pobrinha de extras, provavelmente saída de Sítio Novo. Hehehe. Vem com escassos erros de filmagem, documentário sobre os cantores entre outras desnecessidades, visivelmente foi lançada às pressas para a época natalina e tentar (hehehehe parte 2) conter as vendas dos piratas. Aliás, pensando bem, pra guardar historicamente, a edição pirata seria mais interessante. Pensou contar pra seus filhos que o presidente da época, blábláblá?

Cotação:

19 de dezembro de 2005

Efeito Borboleta

Ao fazer qualquer comentário sobre este filme corre-se o risco de ser preconceituosamente injusto. A começar pelo astro principal, Ashton Kutcher. Difícil levar a sério alguém que surgiu interpretando o estúpido Kevin na série televisiva That 70's Show, e depois, ao ir para a tela grande, optou sempre por fazer espécies de "releituras" deste mesmo arquétipo e tem ainda as freqüentes aparições na mídia fofoqueira a tira colo de Demi Moore. O tema também, viagem no tempo, não lhe dá muitos créditos, ainda mais com a roupagem "para leitoras de Capricho" do material promocional, mas enfim, o que assistir em uma banal noite de quarta? Longe de ser um filme ruim, a ousadia no roteiro e direção de Eric Bress e J. Mackye Gruber seguram bem a diversão. Simplesmente não para terminar de assisti-lo sem se pensar na possibilidade de voltar também ao passado e dar uma arrumadinha em coisas pendentes. Nota-se que tudo poderia ser mais cabeça, inclusive na teoria do caos (o motivo para o título emblemático), mas qual produtor correria o risco de perder as verdinhas de adolescentes a fim de ver apenas um romance com o futuro astro Kutcher? Outra derrapada é o menino malvado ser minúsculo e mesmo assim descer o sarrafo em meio mundo, além, é claro do poder de retroceder no tempo tornar-se, nos momentos finais, uma espécie de pó de pirlimpimpim. O rapaz volta inúmeras e inúmeras vezes quando bem entende, chegando a mandar ao espaço (graças a alguns furos) toda a trama antes inteligentemente amarrada. No balanço geral, ao fim do filme, acabamos por não saber se é um ótimo filme com momentos ruins ou um filme ruim com momentos ótimos.

Efeito Borboleta (The Butterfly Effect)
- EUA 2004 De Eric Bress e J. Mackye Gruber com Ashton Kutcher, Amy Smart 113' Suspense


DVD - Se levarmos em conta os menus, é um tanto quanto amador em sua simplicidade, mas o arrojo do conteúdo eleva a cotação, como alguns curiosos documentários sobre viagens no tempo, e filmes sobre o mesmo tempo. Imperdíveis as cenas deletadas ou alternativas. Há dois finais diferentes além do que entrou na edição final. Tudo poderia ser muito pior...

Cotação:

6 de dezembro de 2005

O Chamado 2

Remakes de horror japonês possuem por si muito mais mistérios do que jorram em suas tramas. Tome por exemplo esta seqüência do sucesso de 2001, que demonstra, não sinal de cansaço da fórmula, mas a formação de um gênero à parte com a possante capacidade de auto-citação antropofágica. Se o dirigido por Gore Verbinski usava apenas como argumento o fantástico original asiático, tendo a inteligência de ir mais além na criação do mito Samara Morgan, este também bebe naquela fonte (o diretor é o mesmo Hideo Nakata) e ainda dialoga com dúzias de outros títulos, o principal deles sendo Dark Water, assinado novamente por Nakata. Dark Water (o original de 2002) estranhamente herdava em seu plot muito mais da fita feita pela DreamWorks (The Ring) do que de Ringu. A carência maternal, o fantasma possessor, a mãe ausente, a água como símbolo do transcendental, etc. Estreando em Hollywood, Hideo Nakata (um dos homens mais influentes da atualidade segundo a revista Time) salpica boa parte deste filme (refeito por Walter Salles recentemente) nesta produção falada em inglês. Assim, pinça o que de melhor surgiu na trajetória de fantasmas femininos, cabeludos, descartando algumas coisas. A maldita VHS agora tem importância quase nula. Sinal da presença da garota malvada são águas, de preferência as escuras! E também há dezenas de citações a clássicos americanos de outros tempos. O Iluminado (The Shining) poderia ser a mais gritante, se não tivéssemos agora a certeza de que Carrie, A Estranha, é a antecessora de Samara (Sadako no original), e quanto a isso não é possível se falar mais sem estragar surpresas. Muito longe do filme de 2001, mas nem tão ruim quanto falaram, mesmo com freqüentes erros de continuidade. Apenas trocou-se o horror pelo suspense, respeitando o personagem principal na medida do possível. O medo nestas obras prova aqui ser cíclico e infinito como se fizesse parte de uma coisa só, independente de qual filme seja, como uma aparentemente desconexa série macabra. Samara, Sadako, Kayako,Toshio ou Mitsuko pouco importa. A originalidade não se impõe no argumento, mas em imagens fortes e inovadoras e, neste ponto, se percebe que atrás da câmera há um japonês. Eles vieram para nos lembrar de que cinema é imagem e, quanto a isso, são mestres absolutos.

O Chamado 2 (The Ring Two)
- EUA 2005 De Hideo Nakata com Naomi Watts, Simon Baker, David Dorfman, Elizabeth Perkins, Sissi Spacek, 111’ Suspense

DVD - O principal atrativo é um curta mostrando fatos que antecedem o longa, com muito mais espírito do filme anterior. Fora isso o básico do básico, com alguns documentários mixurucas e curtos. Atenção a um ótimo easter egg escondido na setinha da tela de extras.


Cotação: