27 de março de 2006

Janela Indiscreta (1998)

Dá pra se deparar com esta verdadeira heresia cinematográfica sem se perguntar o porquê de sua existência? O que havia de errado com o ultraclássico de Hitchcock que o fez merecer uma refilmagem 44 anos depois? A presença do ator Christopher Reeve encabeçando o elenco no papel antes de James Stewart talvez indique alguma coisa já que deve ser raro um roteiro onde o protagonista fique paralisado o tempo todo. Assinando também a produção executiva, o eterno Superman teve neste telefilme (do canal especializado Hallmark) seu último trabalho em longa metragem, o que também explica, provavelmente, o fato da situação física do personagem ganhar muito mais destaque agora. Seu visível esforço em viver e a esperança de um dia tudo voltar ao normal chega a emocionar. Confesso que após ter visto o DVD á venda, ter dado umas risadinhas internas pela ousadia do projeto, à noite não consegui dormir imaginando o que teriam feito com plot tão genial. No dia seguinte fui correndo compra-lo sem esperar absolutamente nada além de um desaforo em forma de celulóide. Darryl Hannah no papel antes de Grace Kelly não é de forma alguma promessa de qualidade já que na época de Kill Bill assumiu que já topou participar de telefilmes horrorosos em troca de estadias em hotéis. Sua filmografia é gigantesca de coisas absurdas. A garota topa tudo mesmo! Infelizmente é impossível assisti-lo sem fazer comparações com a obra original, o que acaba tirando boa parte dos méritos dessa correta adaptação. Lamenta-se a atenção dada apenas à janela do criminoso, e não ao microcosmo geral que é o prédio. Vê-se uns dois ou três outros vizinhos, levando água a baixo a referência original ao cinema como um todo. Diga-se de passagem, a politicamente correta década de 90 deu-nos vizinhos gays, e claro, o voyeur tem alguma tecnologia a seu favor, chegando a ameaçar o assassino via e-mail. Digna de nota a trilha sonora de David Share que espertamente flerta com a original de Franz Waxman ao invés de simplesmente imita-la. Acima da média em produções originais para a TV, esta Janela não chega a ofender nossa inteligência nem magoar nosso amor á obra de Hitchcock, o que já não é pouco.

Janela Indiscreta (Rear Window)
- EUA 1998 De Jeff Bleckner com Christopher Reeve, Daryl Hannah, Robert Foster 102’ Suspense


DVD - Nada versus nada! Menuzinho mal e porcamente animado, seleção de cenas e áudio com a versão dublada no caso de você ser analfabeto. Ux, e dezenas de trailers de produções classe Z que aposto (e prometo!) nunca assistir.

Cotação:

25 de março de 2006

A Praia

A Praia começa mal logo pelo trailer visivelmente voltado ás menininhas que ainda se sentiam molhadinhas com as peripécias de DiCaprio pós Titanic. O segundo filme de Danny Boyle com capital norte americano afugentou não só as doces púberes que não devem ter entendido lhufas daquele emaranhado de violência, drogas e disputa por poder, como os nerds cinéfilos (de verdade) que nem se deram ao luxo de ir assistir a uma película estrelada pelo ex-senhor Bünchen. Bem distante da qualidade vista em seus primeiros filmes (Cova Rasa, Trainspotting – Sem limites), mas nem tão lixo como pode parecer. Ainda estão lá os enquadramentos arrojados, o humor cinicamente cool, a violência extremista se auto justificando e como em todos seus filmes, personagens em busca de seu Shangrilá existencial. Pecado maior é a edição que perde tempo fazendo vez de cartão postal da praia em si, diga-se de passagem, a mesma que se tornou notória com a chegada do tsunami no fim de 2004. E se perdemos tempo de um lado, por outro se corre. De uma hora a outra o protagonista endoidece e ninguém entende direito o porquê, até o mundinho maravilhoso dos maconheiros desanda de forma copiosamente ingênua. Dá pra se divertir, claro, mas ao final há uma frase que não sai da cabeça: “E daí?”.

A Praia (The Beach)
- EUA 1999 De Danny Boyle com Leonardo DiCaprio, Tilda Swinton, Virgine Ledoyen 119’ Aventura


DVD - Menus animados chiquérrimos, todos inteligados! De extra, o principal é o tal trailer ao som de Moby pra você ver que não estava mentindo na resenha e algumas cenas excluídas. Nessas cenas há um final alternativo menos esperançoso que poderia ter salvado a pátria literalmente. A Faixa de áudio com comentários do diretor porcamente não está legendada em português. E tava me esquecendo da “cerejinha do bolo”, um pavoroso clip das All Saints. Quem?


Cotação:

Pi

Darren Aronofsky (a exemplo de Robert Rodriguez e seu El Mariachi) ganhou notoriedade logo em seu primeiro filme não só por suas qualidades artísticas, mas por seus esforços financeiros para levar um argumento absurdamente anormal ás telas do cinema. Nesses casos nunca se tem muita certeza do que é marketing ou realidade, mas reza a lenda que o cineasta com 28 anos simplesmente saiu pedindo 100 dólares a todos os amigos e familiares á sua volta até juntar a quantia de US$ 60 mil que o projeto pedia. Caso houvesse êxito, receberiam US$ 150 em troca. Grande vencedor no Sundance Film Festival daquele ano Pi (lançado no Brasil apenas em DVD pela Europa Filmes) é um refresco em toda cinegrafia mundial. Não assistia a nada de visual tão arrebatador e roteiro tão genialmente tecido a muito tempo. Diga-se de passagem, como filme lembra as ousadias de um Glauber Rocha (só pra nacionalizar a referência á genialidade), pouco se lixando para convenções hollywoodianas. A história, em preto e branco bem granulado, de Max (Sean Gullette) que busca qualquer ordem no caos matemático da letra grega e acaba entrando em um perigoso jogo envolvendo bolsa de valores, existencialismo e até o torá, mesmo tratando de assuntos que não nos são gratos, consegue pela sua execução brilhante nos prender por uma hora e pouquinho e ainda correr para a internet catar qualquer outra informação sobre o assunto. Dá pra esperar o episódio final da segunda temporada de Lost, dirigido também pelo diretor?

Pi
- EUA 1998 De Darren Aronofsky com Sean Gullette, Mark Margolis, Bem Shenkman, Samia Shoair 84’ Ficção Científica


DVD - Raridade em terras tapuias, além de algum texto, tem como extra uma espécie de documentário amador feito em VHS das filmagens até a consagração no Sundance. E não precisa deixar para ver só depois do filme, porque ele não entrega nada e ainda nos faz ter mais prazer ainda na vitória de algo vertiginosamente original.


Cotação:

20 de março de 2006

Kika

Exceto Pepi, Luci, Bom, e Otras Chicas del Montón, já vi absolutamente todos os Almodóvares existentes, o que me faz julgar este o pior de todos. Aliás, pior da filmografia do diretor, leia-se bem, porque mesmo assim está acima da média da grande maioria medíocre vista em forma de película. Após o sucesso internacional em 1988 de Mulheres á Beira de um Ataque de Nervos o diretor virou uma espécie de queridinho de cineastas independentes ao redor do mundo. Imitava-se seu estilo berrante como se apenas isso bastasse para dar algum verniz artístico a produções cinematográficas. Dele seguiu-se Ata-me!, De Salto Alto, e este Kika, respectivamente. Em entrevista na época afirmou que não se importava com imitadores já que eles copiavam apenas o que de mais estridente havia em suas obras, e não o conteúdo elaboradíssimo de seus roteiros. Parece que esta lição foi aprendida em Kika, onde mais forjou o chamado estilo Almodovariano. Vê-se na tela uma profusão de cores, cenários e personagens de psique extremista, em uma trama que não se sustenta por si só. Há um cadáver de importância para a conclusão da trama, mas mal se sabe as motivações do assassino, nem tão pouco quem é realmente a vítima. Este último fato é o principal a deixar desinteressante o que acontece na tela depois de 30 minutos, e sobram muitos outros cansativos minutos. Salvam-se inúmeras sacadas kitsh engraçadíssimas como a empregada lésbica que sonha em ser chefe de presídio feminino, referencias cinematográficas de montão (Hitchcock a principal delas, inclusive na trilha sonora) e atores estupendos dando (literalmente) o melhor de si.

Kika
- Espanha 1993 De Pedro Almodóvar com Verônica Forqué, Peter Coyote, Alex Casanova, Victoria Abril, Rossy de Palma 114’ Comédia


DVD - Antes de ter seu talento reconhecido pelo mercadão (inclusive com dois Oscares) e distribuídos pelas majors norte americanas, os filmes de Almodóvar chegavam até nós, desde lado do Oceano, sabe Deus como. E continuam chegando. Tanto a fase 80’s quanto alguns que se seguiram só podem ser achados no garimpo em bancas de revista, ou no caso deste Kika pela bagatela de R$ 9,90 em grandes hipermercados. Para quem é de outros países tome por base que em dólar seria algo quase como $ 4,95. Com esse preço ridículo você queria o quê? Seco de extras, fora filmografias entre alguns outros textos. Mesmo assim, é melhor que não telo na coleção, né não?

Cotação: